Porque a terra se encherá do conhecimento da glória do SENHOR, como as águas cobrem o mar. Hc 2:14
domingo, 29 de dezembro de 2013
Pentecostes: Quando o Espírito Santo vem
1. “… permanecei, pois, na cidade, até que do alto sejais revestidos de poder.”(Lc 24.48-49).
Quando lemos o Evangelho de Lucas e Atos dos Apóstolos, precisamos entender que estamos diante de uma só obra, redigida em dois momentos. Há, inclusive, estudiosos que defenderam a tese de que Atos teria sido escrito antes, até por ser um testemunho no qual Lucas, em parte, é protagonista e narrador; vejam, por exemplo, as seções nós nos Atos dos Apóstolos: 16.10-18.
O certo é que desde o Evangelho até Atos dos Apóstolos, o grande protagonista, primeiro junto ao Filho de Deus, Jesus, e depois junto aos Apóstolos, é o Espírito Santo. Lucas queria passar aos novos discípulos os fatos pelos quais Deus atuava poderosamente por seu Espírito, desde o Evangelho até as missões aos confins da terra (cf. At 1.8). Ele disse: “…igualmente a mim me pareceu bem, depois de acurada investigação de tudo desde sua origem, dar-te, por escrito, excelentíssimo Teófilo, uma exposição em ordem, para que tenhas plena certeza das verdades em que foste instruído.” (Lc 1.3-4). Depois, em Atos, ele continua dizendo: “Escrevi o primeiro livro, ó Teófilo, relatando todas as coisas que Jesus começou a fazer e a ensinar [...] A estes, também, depois de ter padecido, se apresentou vivo, com muitas provas incontestáveis, aparecendo-lhes durante quarenta dias, e falando das coisas concernentes ao reino de Deus. E, comendo com eles, determinou-lhes que não se ausentassem de Jerusalém, mas que esperassem a promessa do Pai, a qual, disse ele, de mim ouvistes.” (At 1.1,3-4).
O tema do Espírito percorre toda a obra de Lucas; do anúncio do nascimento de João Batista ao de Jesus (cf. Lc 1.15-17; 35; 41; 67; 2.25-27). Tanto o ministério de João Batista quanto o do Filho de Deus é realizado na unção do Espírito Santo (cf. Lc 3.3; 16; 21-22; 4.1; 18). É por isso que a seqüência da obra dos discípulos não podia abrir mão da mesma unção do Espírito Santo. Daí vem o convite-ordenança de Jesus aos discípulos: “Vós sois testemunhas destas coisas. Eis que envio sobre vós a promessa de meu Pai; permanecei, pois, na cidade, até que do alto sejais revestidos de poder.” (Lc 24.48-49). Eles ficaram, e o Espírito Santo veio sobre eles no dia de Pentecostes. Assim, o Pentecostes, além de marco histórico na caminhada da Igreja, é referência de visitação do Espírito Santo. Cada Igreja, cada geração, cada cristão precisa ter o seu Pentecostes. Pentecostes é ser íntimo de Jesus e de seu Espírito Santo; é sentir a cada dia o coração ardendo em fé, confiança, disposição para fazer a obra que Deus vocacionou à Igreja. “… e sereis minhas testemunhas tanto em Jerusalém como em toda a Judéia e Samaria e até aos confins da terra.” (At 1.8).
2. Que características marcaram esta marcha da igreja?
Eles pregavam um evangelho muito simples.
Isso era perceptível na própria pregação de Jesus: “… O tempo está cumprido, e o Reino de Deus está próximo; arrependei-vos e crede no evangelho.” (Mc 1.15). E a Igreja primitiva anunciava: “Ouvindo eles estas coisas, compungiu-se-lhes o coração e perguntaram a Pedro e aos demais apóstolos: Que faremos, irmãos? Respondeu-lhes Pedro: Arrependei-vos, e cada um de vós seja batizado em nome de Jesus Cristo para remissão dos vossos pecados, e recebereis o dom do Espírito Santo.” (At 2.37-38).
O Evangelho era claramente pregado começando pelo arrependimento e a fé em Cristo Jesus. Paulo dizia: “Fiel é a palavra e digna de toda aceitação: que Cristo Jesus veio ao mundo para salvar os pecadores, dos quais eu sou o principal.” (1Tm 1.15). Assim, a questão era uma só: crer em Jesus e aceitar a graça nele revelada; este é o caminho estreito, o caminho do arrependimento.
Arrependimento, no texto original, é metanoia – mudança de mente, ou seja, ver, sentir e agir de maneira diferente. Nas palavras do povo, é ser mudado pela fé em Jesus e pelo poder do seu Espírito Santo. Hoje, não se apela mais tanto para que as pessoas se arrependam e aceitem Jesus. Fazemos apelo para cura, libertação, porta de emprego, etc. Estamos enfatizando o foco errado. Jesus é que faz a diferença. O mundo está precisando, urgentemente, de Jesus. Poucos querem compromisso com Ele; querem, sim, as coisas que perecem: emprego, cura, etc.; mas uma vida com Jesus nem todos querem. A Igreja precisa voltar a pôr as prioridades em ordem; tudo se decide em uma vida com Jesus. NEle e através dEle, que inaugurou o Reino de Deus, é que: “…todas estas coisas vos serão acrescentadas.” (Mt 6.33b). Isso significa que, de fato, doença, emprego, e tantos outros problemas humanos interessam a Deus, sim, e, por isso, interessam à Igreja. A questão é de fundamento: sem Jesus nada é definitivo; com Jesus, uma nova forma de viver e relacionar-se surge e, com ela, cura de muitos males. Uma religiosidade de consumo é o sinal de grupos que exploram o povo.
Eles viviam em constante comunhão e apoio mútuo.
O testemunho de Atos é claro sobre isto: “Da multidão dos que creram era um o coração e a alma. Ninguém considerava exclusivamente sua nem uma das coisas que possuía; tudo, porém, lhes era comum. Com grande poder, os apóstolos davam testemunho da ressurreição do Senhor Jesus, e em todos eles havia abundante graça. Pois nenhum necessitado havia entre eles, porquanto os que possuíam terras ou casas, vendendo-as, traziam os valores correspondentes…” (At 4.32-34). Essa é uma Igreja que faz diferença, uma comunidade de fé assim, o povo está procurando. A Igreja primitiva caracterizou-se, primeiramente, por isso, por ser um povo unido, onde o amor habita. Afinal, amor é o grande fruto do Espírito (cf. Gl 5.22), e a marca evangelizadora da Igreja (cf. Jo 13.35).
Quando aprovamos, como
Igreja Metodista no Brasil, sermos uma Comunidade Missionária a serviço do Povo, tínhamos por visão espiritual deixar de ser uma Igreja de cargos, voltada só para os membros, para ser uma Igreja de portas abertas, voltada para o mundo. Ser um espaço onde todos os seres humanos encontrem acolhimento. Sem discriminação de qualquer espécie.
O Metodismo de Wesley voltou-se para os pobres e as crianças desassistidas. As sociedades e grupos pequenos metodistas eram espaços de acolhimento. Queremos alcançar multidões, queremos crescer e alcançar a população brasileira, mas não queremos tratá-las como multidões sem rosto, sem sonhos e carências. Não queremos que sejam ovelhas sem pastores ou pastoras. João Wesley organizou as festas do amor, visando a fortalecer a comunhão e o apoio mútuo. Ele mesmo relata em seu diário vários momentos desses; vejamos um: “Hoje, também, onde nós nos reunimos, Deus manifestou seu poder; mas particularmente em nossa festa de Amor. A simplicidade com que muitos falaram, declarando a maneira como Deus lhes tinha falado, inflamou o coração de outros; e a chama se espalhou mais e mais, e, tendo ficado quase uma hora mais do que o costume, estávamos constrangidos por ter de separar-nos.”
Por esse empenho no exercício do amor e da comunhão é que a ênfase na ação social, na luta por edificar uma sociedade mais justa, se estabeleceu no meio do Metodismo.
Eles se empenhavam por ser sal da terra e luz do mundo.
A Igreja primitiva levou muito a sério o encargo de ser testemunha de Jesus até os confins da terra (cf. Atos 1.8).
E o foi a começar de suas próprias casas, amigos e familiares: Jerusalém. Vejam o testemunho que Atos dos Apóstolos dá disso: “Muitos prodígios e sinais eram feitos pelas mãos dos Apóstolos [...] porém o povo lhes tributava grande admiração [...] E crescia mais e mais a multidão de crentes, tanto homens como mulheres, agregados ao Senhor.” (Atos 5.12-14).
Paulo se alegra com o testemunho dos irmãos em Tessalônica: “Com efeito, vos tornastes imitadores nossos e do Senhor, tendo recebido a palavra, posto que em meio de muita tribulação, com alegria do Espírito Santo, de sorte que vos tornastes o modelo para todos os crentes na Macedônia e Acaia.” (1Ts 1.6-7).
O Metodismo de João Wesley se impôs num tempo em que a vida da Igreja, na Inglaterra, estava muito desacreditada; o povo era como ovelhas sem pastor; a bebedeira, os vícios, a imoralidade afetava da nobreza ao povo simples; sem mencionar a opressão e semi-escravidão em que viviam parcelas da população como, por exemplo, os mineiros.
Por tudo isso é que Wesley inaugurou uma nova evangelização. O povo não conhecia o Evangelho; sua obstinação foi salvar almas (vidas), ganhar de novo o povo inglês para Cristo, e ensiná-los (discipulá-los) nos caminhos da santidade, da perfeição cristã, para que fossem luz do mundo e sal da terra.
Hoje, nós estamos priorizando o discipulado, porque queremos formar um povo santo, rico em boas obras. A mentira, o jeitinho, a corrupção, a prostituição adulta e infantil, precisam ser abolidas de nossa sociedade. Queremos cooperar como Igreja Metodista para tornar o Brasil uma nação justa, onde habite a justiça, e isso, no nosso entendimento, só será conseguido através do poder do Evangelho, que, pelo Espírito, haverá de gerar um povo santo, apto para ser luz do mundo e sal da terra.
Eles viam as perseguições com bons olhos.
Vocês me diriam: Como pode ser isso, bispo, não é sadismo gostar de ser perseguido, de sofrer? Isso não é Cristianismo, diriam outros. Assim, não vamos crescer! Há, até, uma Igreja que tem como tema a frase: Pare de sofrer!, acrescentaria um terceiro.
Quem está certo? Pergunto eu como bispo. Por favor acompanhe meu raciocínio conforme as Escrituras. O tema do sofrimento é um longo tema teológico na Bíblia. Não vou esgotá-lo, nem de longe, mas preciso dizer uma verdade, e ser honesto espiritualmente com todas as pessoas que são do nosso rebanho metodista.
O tema de igrejas do movimento neo-petencostal, PARE DE SOFRER!, é uma resposta parcial ao drama humano do sofrimento, e, na sua maioria, uma boa propaganda para atrair pessoas. Afinal, quem não enfrenta sofrimento? Porém, preciso afirmar: Não tem apoio nas escrituras sagradas! O livro de Jó está aí para nos ensinar que o justo pode sofrer, sim, e muito. Jesus foi categórico: “Estas cousas vos tenho dito para que tenhais paz em mim. No mundo passais por aflições; mas tende bom ânimo, eu venci o mundo.” (Jo 16.33). O termo usado no grego é thlipsis, cujo sentido é aflição, angústia, tribulação, sofrimento. Assim, irmãos, prefiro ficar com a advertência de Jesus. Vejam que ele faz essa advertência no mesmo capítulo de João, onde anuncia a vinda do Espírito Santo, no qual ele não usa a expressão Pneumatos Agiou – Espírito Santo (cf. Lc 1.15), mas, sim, o Paraklêtos – o Consolador. Por que chama o Espírito de o Paraklêtos? Porque este é um papel dado ao Espírito de Deus: consolar os fiéis. Do quê? Do sofrimento, das lutas, das perseguições que uma Igreja que pretende viver, santa, justa e piedosamente, haveria de enfrentar.
Em nosso país, a desonestidade, o jeitinho, são caminhos usados, para evitar o trabalho, o esforço, muitas vezes o sofrimento; por isso, busca-se a opção que parece mais fácil, o famoso e conhecido caminho largo que, no fim, conduz ao inferno (cf. Mt 7.13-14).
Por fim, o convite de Jesus ao discipulado foi: “Dizia a todos: Se alguém quer vir após mim, a si mesmo se negue, dia a dia tome a sua cruz e siga-me. Pois quem quiser salvar a sua vida perdê-la-á; quem perder a vida por minha causa, esse a salvará.” (Lc 9.23-24). A verdade, irmãos e irmãs, é que estão tentando tirar a cruz do Evangelho, e, sem cruz, não há a expiação dos pecados, não há ressurreição; estaríamos todos condenados eternamente. Temos de abrir os olhos ao povo que está sendo enganado, e muitas vezes explorado em sua credulidade.
Atenção, irmãos e irmãs, isso não retira a cura, a prosperidade, que uma vida nos caminhos do Senhor nos traz, mas, sendo honesto e claro com a Igreja, também não evita as lutas e problemas que a vida neste mundo coloca. A grande diferença é a certeza de vitória que a fé em Jesus nos dá: “Quem é o que vence o mundo, senão aquele que crê ser Jesus o Filho de Deus?” (1 Jo 5.5).
A Igreja Primitiva entendeu ser o sofrimento uma contingência de uma vida para Deus, em um mundo que não tem temor de Deus, que não O conhecia. Tiago, como os demais apóstolos, passou por isso, e adverte: “Meus irmãos, tende por motivo de toda alegria o passardes por várias provações, sabendo que a provação da vossa fé, uma vez confirmada, produz perseverança.” (Tg 1.2-3).
Wesley descreve, em seu diário, com detalhes, as ameaças e sofrimentos causados pelos que se opunham à obra evangelizadora dada por Deus a ele. O que esperamos nós? Uma caminhada fácil de fé? Esta não será a fé bíblica como vimos nos textos citados. Vitória, sim!, mas como ter vitória sem lutas? Todavia, “… em tudo somos mais que vencedores, por meio dAquele que nos amou.” (Rm 8.37).
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